quinta-feira, junho 08, 2006

Só porque hoje ando lírico

Começa o verão. Em Israel é o fim da colheita de trigo que cresce no norte do Neguev. Ao contrário do Brasil, os latifúndios aqui são pequenos e diversificados. Em vários Kibutzim, Moshavim e fazendas na região crescem em pequenos campos trigais, pomares e plantações de girasóis. O dia estava glorioso: depois de uma semana de calor infernal, finalmente eu conseguia dirigir sem ligar o ar-condicionado. Só calor, nada daquela sensação de forno de padaria e céu amarelado.

E eu fui dirigindo de Raanana, no norte de Tel-Aviv até Netivot, onde eu tinha que dar aula pouco tempo depois. Trânsito na estrada 4, como sempre, engarrafamentos na altura de Petach-Tikva, e depois em Ashdod, mais ao sul, do lado de onde eu moro (dei tchauzinho simbólico para a Preta que, coitada, vai ficar sem passear hoje). Daí em diante o cenário parecia de filme. Os trigais já foram colhidos, mas os fardos de palha continuavam no campo. Do lado, um campo de girosóis. Me lembrou a época em que cheguei em Israel e fazia passeios a pé intermináveis naquela região (mais por falta do que fazer do que por esporte – velhos bons tempos). Campos de girasóis aqui têm cheiro de eucaliptos, porque quase todos os campos são cercados de árvores, bem como as estradas. (Sabem por que? Solução criativa de quem precisa se locomover sem ser alvo de franco-atiradores palestinos).

De longe, em alguns lugares se viam cubinhos brancos com triângulos vermelhos por cima: Kibutzim e um pedaço de Sderot que se vê da estrada. Cheguei cedo. O rádio estava legal e eu resolvi sentar no estacionamento que fica na beirada de uma dessas plantações de cubos amarelos. Abri aquela cartolina horrorosa que se usa para proteger o parabrisa do sol quando se estaciona e sentei em cima. Me senti um muçulmano abrindo o tapete para rezar em direção a Meca. A diferença era que eu lia meu livrinho (The Kite Runner – que eu também preciso às vezes alguma coisa para só-ler-e-não-pensar-em-nada) e ouvia musica irlandesa voltado ao por do sol (assim que minha Meca fica em algum lugar na Europa – talvez Irlanda...). Fiquei pensando como é legal essa mistura de cidades e plantações, onde se vê uma linha bem definida onde começa um e termina o outro. Onde eu moro é assim, e a Preta adora sair da cidade e entrar no campo, onde eu invariável e propositadamente me perco, para me achar (em todos os sentidos) horas depois.

Fui achado pouco antes do começo da aula pelo Lior, o único da turma que chega na hora. Deu oi, achou engraçado eu descalço, sentado no chão em cima de um tapete de cartolina, portas do carro abertas, ouvindo musica e lendo. Mas entendeu e acho que até gostou da ideia. Pouco depois me arrumei e subi para a aula. Já estava ficando escuro e - surpreendentemente – frio. Meus Routers, cabos e Switches me esperavam. Khaled Hosseini vai ficar para o fim de semana.

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